segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A alma está fria, as mãos estão quentes

Caminho nas sombras da noite procurando a claridade da realidade. Está frio, a alma está fria, as mãos estão quentes.

Caminho na sombra da noite que desprezo. Escuridão é uma capa que oculta. Protege e ataca os desprotegidos. Gosto do dia, da claridade batendo nas coisas mostrando-me a mais pura das realidades.

Caminho na sombra da noite num passo acelerado. Está frio. A alma está fria. Por entre o tempo que passa sem cessar, procuro acelerar o passo para que não pare. O tempo não pode estagnar, não faz sentido. Para o tempo numa realidade distante em que o olhar ultrapassa a realidade e vagueia entre pensamentos e datas e factos. Não, o tempo não pode parar. Se paro, estagno nessa noite e nesse frio de alma em que não faz sentido ficar. Há coisas que não fazem sentido, não são racionais. Passam dias e horas e segundos e continua a não ser real. 

Caminho na sombra da noite pensando que devia caminhar mais devagar. Ninguém me acompanha, não tenho ninguém ao meu lado. Caminharei depressa demais, ou terei ficado restringida a um único caminho, perdendo a noção que há mais estrada para além desta?

Caminho na sombra da noite procurando desesperadamente o dia. A claridade. A motivação. A esperança.

A alma está fria mas as mãos estão quentes. Resta-me aproveitar enquanto estão não estão frias e dar-lhes utilidade. Trabalho. Caminho. Dia. Luz. E enquanto sigo perdida, sem saber que caminhos tomei, evitando olhar para trás, para o escuro da noite, procuro não parar, acelerar o passo e fazer sempre mais. “Não há tempo suficiente”. Não importa. Pelo menos, há dia.

terça-feira, 29 de maio de 2012

O Piano


O piano está coberto de pó, camada invisível de poeiras que vagueiam ser serem vistas e que tapam a beleza mais pacífica da divisão. O preto e branco, ainda assim, são visíveis, tons esbatidos por aquela camada de imperfeição. O tempo é demasiadamente pouco para que os dedos toquem aquelas claves e se percam nas melodias inacabadas. Voltar ali seria voltar ao passado, retomar o que ficou estagnado. Voltar a tocar no piano que ritmadamente coordena a consciência e engana a mente entre um sol e um dó mais ou menos rápido. Os dedos entrecruzam-se num ápice tão grande que engana o olhar, fixo apenas em pretos desenhos em papel de um branco sujo pelo tempo. Voltar a soltar um Fá seria retomar a um passado do que fui, partes perdidas nas correrias do tempo. Seria voltar a tocar melodias de amores, de felicidades, de tristezas e de desilusões. Mas o coração não resiste, a mente prepara-se e os dedos entrecruzam-se num ritmo demasiado apressado para que os olhos acompanhem.
E a poeira que teimava em cobrir o piano rapidamente se desvanece para que possa soltar-se de novo a melodia. E agora, a grande questão será: que melodia tocar?