domingo, 30 de novembro de 2008

Retrato nosso

Reparo num retrato perdido, nosso. Retrato de há tanto tempo mas ainda tão recente. Relembro o momento da sua existência. Recordo-o com saudade, o mesmo sentimento que sinto acerca da tua pessoa. Tenho saudades de te conhecer verdadeiramente, tal como acontecia naqueles particulares momentos, tão singulares e vulgares. Os retratos não passam da capa de uma história nossa, um passado já escrito cujas entrelinhas apenas nós conhecemos. Cuja escrita é apenas nossa. Cujos protagonistas somos nós. As promessas de acabar o conto com o costumado final feliz foram quebradas pelo nosso afastamento. Agora falta a coragem para pegar na caneta e recomeçar o inacabado. Falta preencher as páginas com as palavras todas que ficaram a pairar no ar, que ficaram por dizer. São tantas, que desisto de as tentar pronunciar. Pertencem ao passado e, no entanto, estão ainda tão presentes. Olho para o retrato do passado e vejo-te completamente diferente. Estás diferente, muito diferente. Passo por ti agora e sinto que já nem te conheço, sinto que te transformas-te interiormente, tornando-te desconhecido para mim. Mas tudo não passam de retratos que fazes questão de ignorar quando, de vez em quando, relembro. Porque são esses retratos que nos fazem sorrir. E um dia, assim o espero, finalizaremos a nossa história. Porque todos temos uma.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Desconhecido

Olho para uma imagem tão comum, de mim, uma imagem tão desconhecida. Olho-me seriamente tentando decifrar aquilo que vejo, tentando ver o invisível. Desconheço-me, não sei quem sou. Olho para um exterior que me é depreciativo, que nada me diz. Busco-me na incerteza de especulações, na vivência diária de uma vida sem rumo exacto, sem destino certo. Ultrapasso obstáculos constantes, diariamente. Escondo emoções e opiniões com medo de errar aquando do pronunciamento dessas mesmas palavras. Chego ao fim do dia, cansada de tudo e, num papel, desabafo incertamente, confusamente. São ideias desorganizadas que recolho e tento sequenciar, escusados gestos que, no entanto, me mantêm ocupada. Gestos que sei não serem eternos. Escrevo palavras infiéis a sentimentos, retratando uma lição de vida aprendida na simplicidade de um gesto. E são muitas as lições. Olho para mim e busco as mudanças positivas que terão surtido, procurando razão essencial para a busca constante da essência da vida. Olho para mim e desconheço-me. Vasculho o álbum de memórias e imagens, relembrando aquilo que sou e que fui, desconhecendo a razão pela qual existem tantas diferenças entre aquilo que sou em diferentes fases de mim. Admiro algumas qualidades minhas, sem saber qual a razão para a sua presença incansável. Arrependo-me dos meus defeitos. Sou mero corpo habitante de uma realidade, tendo-me sido atribuído um nome. É esse o nome que busco como identidade pessoal, marca de mim, de quem sou. A imagem continua, ainda desfocada. E desconheço-me, não sei quem sou.